COLOCANDO A CONVERSA EM DIA
— Oi Vera, há quanto tempo?
— É faz muito tempo mesmo!
— Está indo para onde?
— Para Santo Antônio, mas estou levando somente uma das minhas crianças.
— Você tem quantas crianças?
— Três.
— Você já se casou?
— Casei que nada.
— Mas tem que casar?
— Casar, Deus que me livre disso!
— E a segurança de seus filhos? Você não pensa nisso?
— Não gosto de ficar presa a homem nenhum. Mulher casada é igual a passarinho na gaiola. Ainda quero um pouco de aventura nesta vida.
— É mesmo! E seu marido não tem ciúmes?
— Morre de ciúme de mim. Ele me trouxe no ponto e ficou dando uma porção de recomendações.
— E seus pais, como vão?
— Não gosto nem de lembrar. Os dois morreram no ano passado; com apenas uma diferença de trinta dias um do outro. O meu pai morreu primeiro e depois, de tristeza, a minha mãe também morreu.
— Foi alguma doença que pegou os dois?
— Nada de velhice mesmo.
— Você é a caçula lá da sua casa, não é?
— Não! Você não se lembra dos meus irmãos?
— Juro que não me lembro mesmo.
— Pois é! Eu sou a do meio. Tenho um irmão mais velho e uma irmã mais nova do que eu.
— Estou tentando puxar pela memória, mas acho que não lembro realmente deles.
— O meu irmão é o Jackson, mulherengo igual a ele eu desconheço. Ele já “juntou” com mais de umas dez mulheres. Só as que eu fiquei sabendo.
— Dez mulheres? Ele deve ser muito bonito?
— Que nada! Eu não entendo essas moças de hoje, não podem ver um homem em uma “motoca” que já vão logo querendo agarrar.
— E sua irmã?
— Ela acabou de ganhar um bebê.
— Ela é casada?
— Também não. Ela escondeu a gravidez até não poder mais. Quando ficamos sabendo, ela já estava com um barrigão enorme. Mas a criança é uma linda menina muito sorridente. Estou indo visitá-la.
— E agora, o pai da criança assumiu a responsabilidade?
— Que nada. O pai da menina é um adolescente como a minha irmã mesmo, daqueles que os pais é que sustentam pela vida afora. Depois que a criança nasceu, os dois terminaram o namoro e pronto.
— Nossa! Que história complicada a da sua família. Ainda bem que eu sou filha única.
— Sorte a sua mesmo. Família é muito bom por um lado, mas pelos outros lados dá um trabalho danado.
— E como a sua irmã está arrumando?
— A sorte dela, é que ela ficou com a casa em que moravam os nossos pais. Sem emprego e sem estudo ela só consegue cuidar da menina, sobrevivendo com o pouco que a gente pode ajudar e da caridade dos desconhecidos.
— Nossa!
— Quando alguém aparece para visitá-la, ela não cabe em si de alegria. Pois passa a maior parte do tempo sozinha, sem ninguém para conversar sobre as suas amarguras. Mas a vida é assim mesmo, cada um colhe o que plantou.
— É hora de descer.
— Até outro dia!
LIVRO CONTO, RECONTO; ENCONTRO OUTRO CONTO III. ESCRITOR JOSÉ MARIA CARDOSO.
Sem comentários:
Enviar um comentário