sábado, 25 de agosto de 2012

CONTAÇÃO DA HISTÓRIA “A REBELIÃO DOS LIVROS” NA EE MENINO JESUS DE PRAGA CARATINGA

 

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CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS NA EE MENINO JESUS DE PRAGA CARATINGA.

HISTÓRIA DO LIVRO “A REBELIÃO DOS LIVROS” ESCRITOR JOSÉ MARIA CARDOSO COM ILUSTRAÇÕES DE GLAUCO NOVAES, EDITORA CARATINGA 2010. LIVRO GANHADOR DO II PRÊMIO DE LITERATURA INFANTIL MARILENE GODINHO DA SECRETÁRIA DE CULTURA DE CARATINGA.

NESTE DIA AS CRIANÇAS DA EE MENINO JESUS DE PRAGA PUDERAM CONHECER A HISTÓRIA DA “REBELIÃO DOS LIVROS”, E DE SEUS PERSONAGENS PRINCIPAIS O “CAPA DURA” E O “LIVRO VELHO”.

O MOMENTO MAIS ESPERADO É DEPOIS DA HISTÓRIA QUANDO OS ALUNOS MANUSEIAM OS BONECOS DOS PERSONAGENS “CAPA DURA” E “LIVRO VELHO”.

 

FOTOS DO ARQUIVO DA ESCOLA, PRESENTE EM SEU SITE:

http://eemeninojesusdepraga.blogspot.com.br

domingo, 5 de agosto de 2012

LIVRO COMPLETO: CONTO, RECONTO; ENCONTRO OUTRO CONTO–MEU TERCEIRO LIVRO 2008

ESCRITOR JOSÉ MARIA CARDOSO LIVROS (1)

CONTO, RECONTO;

ENCONTRO OUTRO CONTO

 

 

 

Um livro que procura falar sobre os vários momentos da vida através de contos fictícios; histórias feitas para as pessoas que não acreditam e para as que acreditam na força transformadora que o amor (seja qual ele for) tem na vida dos seres. Uma chance para entender que: os fatos simples da vida escondem a beleza e as surpresas do que realmente é importante, o amor. Abra o seu coração e deixe as palavras cativantes, destas páginas, tomarem conta de todo o seu ser!

 

 

 

*   *   *

 

 

Dedico esta obra às pessoas que sonharam

juntamente comigo e que possibilitaram a

concretização de mais este sonho.

 

 

A Deus,

aos meus familiares,

 aos amigos, aos colegas de trabalho,

às pessoas que vivem a vida com amor.

 

 

 

 

 

 

 

O mundo é uma representação distorcida de um desejo que, com o tempo, poderá ou não formar uma paisagem nítida. Tudo depende da forma de olhar as coisas e da dedicação na caminhada até o objetivo. 

 

José Maria

 

 

O DESEJO NO CORAÇÃO DO POETA

 

 

 

Quero fazer um conto, um lindo conto de amor

Um conto de um amor total, um amor sem fim

 

Quero escrever um conto, um conto com amor

Que não passa nunca, que não pára de crescer

 

Quero poetizar um conto, um conto sobre o amor

Que vença a idade do tempo, que vença as grandes distâncias

 

Quero contar um conto, um conto cheio de amor

Que vença tudo e todos, que sobreviva mesmo depois da morte

 

Quero narrar um conto, um conto para o amor

Que fale e viva da paixão, que não recue diante da palavra medo

 

Quero profetizar um conto, um conto máximo de amor

Em que a personagem não tenha receio de amar o impossível

Que continue amando mesmo com a recusa do outro amante

 

Quero fazer, escrever, poetizar, contar, narrar e profetizar um conto

Um conto de amor, um conto com amor, um conto cheio de amor

Mas sobre tudo, quero viver um grande amor em forma de conto!

 

 

*   *   *

 

Escrever é viajar por um longo tempo por um mundo desconhecido, voltar por um minuto à realidade ao terminar cada história de um livro e depois continuar a sonhar, agora com outro mundo, completamente diferente do anterior, na pele também de outro personagem.

 

José Maria Cardoso

 

SOBREVIVENDO PELA FORÇA DE UMA PAIXÃO

 

          Em um dia qualquer, andando pelas estradas solitárias da minha existência de adolescente, encontrei alguém que me deu um novo sentido para a palavra “viver”. Esta pessoa foi você. Desde o primeiro olhar que trocamos, senti que você era uma pessoa especial para mim. Mas nem imaginava quanto. Uma pequena conversa em uma sorveteria, agitada pelos embalos de sábado à tarde e pelo calor do verão, foi o início de toda a nossa história. Da sorveteira fomos para a praça mais próxima da cidade. Um banco frio de cimento foi o palco de nossos primeiros beijos e abraços; as pessoas, que passavam apressadas e nem notavam a nossa presença, foram as nossas testemunhas quando juramos fidelidade eterna um ao outro, mesmo sendo ainda nosso primeiro encontro.

          Os dias, os meses e até mesmo os anos que se seguiram, foram uma repetição constante da sensação gostosa do nosso primeiro beijo, foram de intensa paixão entre nós dois. Você sempre dizendo que me amava e, eu por minha vez esperando você dizer “Te amo!”, para depois dizer um “Eu também!”; não de forma mecânica, mas cheio de emoção. Confesso, que em alguns momentos, tinha ciúmes, principalmente, do seu jeito de andar: imponente, despojado e gracioso; alvo do olhar insistente dos garotos de nossa cidade. Você caminhava com passos sincronizados; passos no mesmo ritmo do meu coração apaixonado.

          Como era gostoso aquele amor ainda proibido pela idade e por nossos familiares. Você sempre arrumando um desculpa para me encontrar. Uma vez, era uma tarde de estudo na casa de uma amiga; outra vez, era uma colega que precisava imediatamente de sua ajuda em casa; em outra vez ainda, era a desculpa de uma oração em uma capela distante. Da minha parte, era sempre a mesma desculpa: jogar futebol com os amigos no campo de terra ao lado da escola. A minha mãe não cansava de dizer: “Assim, você vai virar jogador profissional antes da idade meu filho. Dá um descanso para a bola. Coitada dela!”. A verdade, é que meus amigos viviam reclamando por ficarem sem o seu “melhor jogador”, quase todas às tardes. Como foram importantes aqueles momentos em que passávamos sentados nos galhos da mangueira de pomar no quintal ao lado de sua casa, fazendo planos para o nosso futuro; enquanto olhávamos atentos à aproximação do “abominável vizinho”, que sempre nos repreendia por nossas aventuras no quintal dele. Mas ele também era nosso cúmplice, pois nunca contou nossas aventuras para seus pais arcaicos, que não entendiam nossa forma de amar. Sim, planos para o nosso futuro, pois jamais imaginamos que viveríamos futuros diferentes, em locais e vidas diferentes. Sentíamos que realmente um havia sido criado especialmente para o outro.

          O tempo passa, e com ele surgem as exigências da responsabilidade imposta pela sociedade e pela idade, o nosso futuro dependia de seguirmos caminhos diferentes dos traçados por nós. Pois, agora, os que ditavam as regras eram nossos pais e a sociedade, totalmente arbitrários, que não viam com bons olhos a nossa paixão avassaladora, a nossa entrega um ao outro. O desespero tomou conta de nós dois. O que fazer para continuar nossa paixão? Como mudar o pensamento de nossos pais? Como fugir das responsabilidades para com o país? O destino cruel cumpriu seu dever e nos afastou, um para o Serviço Militar Obrigatório, o outro para a Universidade em regime de internato. Os quilômetros que nos separavam não eram tão grandes quanto à impossibilidade de contato entre nós.

          Enquanto eu aprendia manejar uma arma letal que disparava vários suspiros de morte por segundo, você trabalhava com uma arma muito maior, a caneta, que tem o poder de criar e destruir mundos; de dar ou retirar a vida de milhões, com um simples rabisco em um papel, em milésimos de segundo. Foi uma caneta inocente, nas mãos de um “comandante rabugento”, que me levou para guerrear em campos nunca imaginados por mim. No dia da nossa partida, a minha e a de mais milhares de jovens companheiros, para os campos de batalha, o Comandante da Infantaria nos disse que iríamos à guerra para lutar pela paz, pela liberdade, pelo país e principalmente pelas pessoas que amávamos. Pensar que estava lutando por você foi minha única consolação durante todo o tempo cruel das batalhas horrendas. Quando não havia mais forças para lutar, eu fechava os olhos e por um instante de loucura sentia você dizendo para continuar, pois estaria esperando por mim no final de cada confronto com o inimigo. Quantas vezes eu gritei o seu nome ao acertar o coração de um soldado rival, agarrando-me no eco das minhas palavras para sentir a sua presença ao meu lado. Quando se carrega o peso do mundo nos ombros, o melhor a fazer é firmar bem os pés; mas eu nunca fora preparado para aqueles momentos, e meus pés vacilavam a todo o momento.  Os mesmos anos que passei na guerra ingrata; foram os anos que você passou sentada em um dos bancos da Universidade tornando-se doutora. Será que um dia nossos destinos iriam se encontrar novamente? Será que nossos corpos mutilados pelo tempo e pela dor voltariam à paz de nossa paixão? 

          Quanta ironia. Eu que tinha vindo para a guerra lutar pela paz, pela liberdade, pelo país e principalmente pela pessoa que amava: você; só via violência de todos os lados; éramos condenados aos maiores horrores possíveis. O país estava tão distante que parecia rejeitar aqueles seus filhos. Você era uma paixão abstrata, agora somente parte dos sonhos de um quase louco guerreiro de baioneta nas mãos. Mas diziam que a guerra já estava quase no fim.

          Voltar da guerra já era um grande prêmio, ter a chance de novamente encontra com você era um sonho fortificante e amedrontador ao mesmo tempo. As patentes, as medalhas, os diplomas e os certificados de Honra e Bravura que me acompanharam na volta, em nada me ajudaram para acalmar o meu desejo de encontrá-la e saber o que havia ocorrido durante todo o tempo em que estive fora do país e de sua vida; só eram pesos inúteis em minha bagagem. Será que nossa proposta de fidelidade eterna havia sido cumprida por você? Será que ainda me esperava? Ou havia desistindo, pois julgava que eu estivesse morto? Juro que o sofrimento do campo de batalha foi pequeno,  comparado com a minha ansiedade pelo seu amor; pela proximidade em metros e a longa distância provoca pela falta de informações que me levassem até você.

          O primeiro passo ao chegar a minha cidade natal, foi ir até a linda e enorme casa em que você morava no final da rua. Como ela estava triste, sozinha e em cacos. Destruído também estava o pomar de nossos encontros furtivos, como a tributar pela ausência de um grande amor nos galhos de suas árvores. Fique ali a imaginar onde poderia lhe encontrar, onde seria o novo lar de seus familiares. Um pedestre que estava passando na rua, vendo o meu olhar perdido nos destroços da casa, disse-me que a família, que antes morava naquela casa, mudou para a capital. Agarrando-me a uma última esperança, perguntei si por acaso ele não sabia o endereço, pois seria quase impossível encontrá-la na imensidão da cidade grande. Ele simplesmente respondeu que não. Andei por várias ruas de nossa antiga cidade, conversei com todas as pessoas que me davam atenção e nenhuma notícia sua. O seu nome tornou-se um enigma para os moradores daquele pacato lugar; assim como o meu também havia caído no esquecimento de todos dali. Apesar do meu nome ter sido reconhecido e temido em vários cantos do imenso mundo da guerra, ali não passava de um estranho procurando por uma grande “paixão-ilusão” do passado.  

          A minha dor fez com que entrasse no primeiro barzinho que surgiu em minha frente. Dentro daquele lugar imundo, encontrei as bebidas alcoólicas, que por um momento fizeram-me esquecer de você. Naquela noite, dormi nos braços de outras mulheres pela primeira vez, quebrando assim o nosso trato de fidelidade eterna. Quando a consciência voltou, eu entrei novamente em desespero e a solução encontrada, na minha fraqueza diante da solidão, foi voltar a beber de forma compulsiva. Por você torne-me um moribundo a vagar de bar em bar, a procurar todas as noites uma nova mulher, na esperança de encontrar em uma delas o seu rosto de feiticeira. Um dia depois de muito beber, vários tipos de bebidas alcoólicas e de gastar todo o dinheiro que havia ganhado matando “inocentes soldados inimigos”, entrei no meu carro e disparei pela estrada deserta. A estrada estava totalmente livre para mim, mas havia uma árvore na margem dela. Como uma fecha a acertar o alvo, bati na árvore com toda a força produzida por um veículo com potência nas quatro rodas. Inconsciente, viajei para o infinito passado, aquele em que aconteceu a nossa paixão, que vivíamos e fazíamos planos sentados no galho da mangueira. Apenas recordações de um homem a beira da morte.

          Acordei, anos depois, em um leito de hospital. Uma doutora simpática vinha todos os dias ver-me. Ela pegava em minhas mãos, acariciava com afeto as minhas várias cicatrizes, olhava o meu quadro de saúde que não melhorava, dava instruções a uma enfermeira que não saia do meu lado e depois ia embora prometendo voltar no outro dia. Com todo o corpo praticamente imóvel, os meus olhos eram a única forma de demonstrar que ainda existia vida consciente em mim. A presença diária da doutora passou a ser o momento mais esperado por mim, o perfume dela enchia todo o quarto com uma fragrância de vida; e vida era tudo o que eu necessitava naquele momento.

          A história de um homem em estado de inconsciência profunda há vários anos percorreu todo o imenso hospital, tornei-me uma espécie de “prêmio” para toda a equipe médica, para os enfermeiros e enfermeiras e principalmente para os outros funcionários, que viam em mim um símbolo de resistência e de luta pela vida, mesmo sem saberem uma única informação sobre mim e meu passado. Todos os movimentos, que eram percebidos em meu corpo, eram comemorados como uma vitória em uma partida de futebol em dias de clássico.

          Um dia, alguém, diferente das pessoas anteriores que entravam e saiam do meu quarto, aproximou-se da minha cama. Sentou do meu lado e deu-me um beijo na testa. Os meus olhos instantaneamente ganharam uma nova vida e pude visualizar o seu olhar, suas duas covinhas no rosto eram inconfundíveis para mim. Em um momento de total aflição e esperança, você abraçada o meu corpo desfalecido, sussurrou palavras há tempo esquecidas por mim. Senti algo diferente acontecendo em meu corpo, meu coração começou a bater com mais intensidade, o meu cérebro deu o grande comando: já é hora de acordar companheiro e de viver sua vida. Os meus braços ganharam vida própria e abraçaram-lhe com força. Sua primeira reação foi de medo, depois de completa alegria. Finalmente estávamos juntos novamente e em condições razoáveis de viver nossas vidas, uma lado a lado da outra.

          Em poucos dias, eu já estava morando em uma casa simples, mas cheia de requintes de fraternidade para comigo. Era a sua casa, não a de sua família, mas a casa que há muitos anos atrás nós havíamos imaginado para viver. O seu zelo por mim foi total e, sua presença fez-me recuperar mais rápido de estado doentio. Descobri que você havia mantido sua promessa de fidelidade eterna a mim, o que me trouxe grande alegria. Contei-lhe sobre os meus casos, sobre as outras mulheres que esquentaram minha cama. Você, simplesmente, disse que procurava por mim todos os dias e em todos os lugares havia anos, desde que soubera do fim da guerra. Perdão total entre nos dois.  Fizemos novos planos, menores que os primeiros, mas com o tamanho exato para serem realizados brevemente.

          O nosso casamento foi maravilhoso, os filhos vindos dele encheram as nossas vidas da mais perfeita satisfação; tê-la por perto em todos os instantes da minha caminhada para a velhice, foi a minha ponte necessária para chegar até aqui. A minha paixão por você continua acesa e, posso dizer que se fosse necessário, passaria todos os momentos de sofrimento que passei na vida só para ter um pingo do seu amor. Construiria novamente o meu viver com paixão. Paixão esta que transborda no meu ser e vai de encontro ao teu ser.  Eu te amo! E amo mais e mais a cada novo dia que estou junto com você. Que seja assim para sempre, para a eternidade!!!...

          De seu eterno apaixonado, João Carlos, o seu Carlinhos.

 

 

 

 

CORAÇÃO SOLITÁRIO

 

            No dia em que terminamos o nosso relacionamento amoroso, era madrugada de um sábado para domingo, momento de muita badalação nos bares e boates da nossa cidade. Naquele dia, em especial, eu estava realmente triste, no sentido mais profundo da palavra tristeza. As suas últimas palavras haviam realmente mexido comigo. Perambulei de bar em bar, até não saber mais em qual deles encontrava-me. Perdido, sem saber o que fazer; entrei em meu carro e saí cantando os pneus. No meu pensamento, nuvens de ilusões ameaçavam transformar-se em uma grande tempestade de sofrimentos. Percorri várias ruas até perceber a presença de uma grande multidão em uma praça. Parei o carro em uma rua pouco movimentada e caminhei em direção àquela multidão. Rostos e mais rostos desconhecidos, alguns incessíveis a minha presença, iam sucedendo-se na minha frente. Os rostos daquelas pessoas diziam-me em silêncio: este não é o seu lugar. Um sentimento de vazio, muito maior que a falta de água no oceano; mais intenso que a inexistência de luz no universo, começou a tomar conta do meu ser. A cada novo passo que era dado na direção central da praça, para o meio da multidão que delirava com o show de um artista famoso, a minha consciência foi sendo sublimada, até que me vi sozinho, completamente sozinho, solidão total de corpo, alma, espírito, emoção...

No meu vácuo existencial, comecei a reviver os acontecimentos que me levaram a ficar assim: um nada no todo, um refém de mim mesmo... Relembrei os momentos em que havia dito não às minhas chances de felicidade. Lembrei o nosso primeiro encontro, sem compromisso; nossas pernas bambas, no primeiro beijo; nossos encontros escondidos no cinema, os piqueniques com a galera nos finais de semana, os dias em que não conseguíamos largar um ao outro, mesmos quando a responsabilidade falava alto, o amadurecimento de nossa paixão, em um amor entrelaçado e exigente; nos longos momentos que os seus braços estavam em volta do meu corpo e da concretização do nosso amor. Por outro lado, também lembrei das palavras malditas, dos silêncios que machucavam um ao outro, das escapadas minhas na madrugada, dos bares que tive como companheiros, das outras mulheres que acolhi no coração e no corpo, das desculpas e do fim inevitável.

Naquele deserto mental no meio da multidão, vi que a felicidade esteve ao meu lado por muito tempo. Era só erguer uma das mãos e tocar no mundo nosso: você, o amor e eu. Mas deixei que toda a nossa muralha de amor transformasse em um castelo de areia.

Um som, ao longe, começou a chamar a minha atenção, corria desesperadamente em várias direções e nada de encontrar o rumo certo daquele som. Só queria correr em sua direção, mas havia perdido o caminho que levava a seu coração. O meu cansaço espiritual era enorme. Neste momento, o vazio, o nada que transformara o meu ser, começou a ganhar um novo sentido, percebi que a vida estava voltando, que o coração ganhava nova pulsação. Senti a adrenalina percorrendo todo o meu corpo e ao mesmo tempo dando o comando para o cérebro, para voltar à consciência. A vida voltou com tanta intensidade, que gritei o seu nome de forma assustadora; tão assustadora que sufoquei todo os outros sons que estavam vindo ao meu encontro. Notei que agora as pessoas notavam a minha presença e questionavam o que havia acontecido. Por um momento senti a sua presença novamente ao meu lado. Ergui as duas mãos em sua direção, mas abracei apenas o vento da solidão.

            De um lugar qualquer, eu ouvi uma frase que me deu mais vida.

            ____ Ele é um fracassado, pois não sabe lutar por seu amor.

            Como um relâmpago no meio das tempestades, dei um pulo no ar. Um grande sorriso brotou na minha face ainda desfigurada, olhei para a multidão com os olhos da alegria e decidi que era preciso recuperar o que havia perdido, mas que não tinha como esquecer: a felicidade, o nosso amor... A minha consciência dizia insistentemente para ir de novo ao seu encontro. O mundo é uma representação fiel de nossos desejos mais íntimos e desejo de voltar a ser feliz era o que mais havia em mim naquele instante. Esperança, esperança, esperança... Caminhei até o meu carro e voltei a percorrer as estradas da perspectiva da alegria. E caminho, até hoje, nesta busca da felicidade; na busca de seu amor, ainda não o encontrei, mas sei que estou muito próximo... Basta um sim, vindo de você.

De alguém esperançoso, de Fernando para Marta.

 

 

 

UMA NOVA CHANCE PARA AMAR

 

          Espero por você novamente para também um novo romance, que vá preencher o meu coração triste com a alegria da paz e da luta amorosa. Espero o seu amor para restaurar a minha confiança, retirar dos meus pensamentos os medos que me confundem, encher o espaço que há dentro deste meu pobre peito depois que você partiu. O meu coração insiste em sofrer a sua falta, ele chora noite e dia sem ao menos saber ou ter a esperança de sua volta ao nosso cantinho de amor.

          Venha sol do meu amanhecer, ajude-me a enxugar as lágrimas que insistem em correr pela minha face desfigurada pelo tempo e pela falta de seu amor; corra para os meus braços e auxilie-me a levantar a cabeça para um futuro maior, faça-me esquecer esta existência medíocre.

          Volte a olhar para mim daquela maneira simples que só você sabe olhar. Volte para minha vida e permaneça ajudando-me a crer que sempre ainda é tempo de sonhar com a liberdade de nosso amor. Caminhe do meu lado para que você possa compreender o meu cansaço, que está presente em minha vida pela falta de você. Coloque o teu ouvido no meu coração e ouça os meus anseios, pois só assim compreenderá a minha luta na busca deste amor.

          Ao longe, vejo você correr para os meus braços. Paro o que estou fazendo, esfrego os olhos para ver se estou sonhando e vejo que você continua a correr em minha direção. Em um momento de pura alienação, corro em sua direção de braços abertos, sinto que vou conseguir abraçar-lhe, mas a ilusão acaba e vejo-me sozinho na multidão que me rodeia sem saber do meu sofrimento, sem compreender o que é sofrer de amor.

             A minha vida espera por você como a terra seca espera pela chuva depois de um longo e tenebroso período de estiagem. Estarei esperando por você com o amanhã espera pelo orvalho; como a noite espera pela luz para tornar-se dia; como o finito ser humano espera pela eternidade. A esperança que vive em mim será capaz de transformar este meu sofrer em completa felicidade, basta para isto que você volte amor. Volte a morar no peito meu! Volte amor, pois preciso de seu amor para viver a minha própria vida! 

          Com paixão acima do limite, de Marta para Fernando.

 

 

 

 

DELÍRIOS DOS MOMENTOS SEM VOCÊ

 

No jardim das flores do sentimento

Sinto tua falta lamuriando insistente

Salta do peito um grito de grande dor

Você não sai do meu coração doente

 

Sua presença faz bem ao meu equilíbrio

Entra em mim a segurança ideal à vida

Você é luz, os seus olhos um farol em néon

A mostrar o caminho quando estou sem saída

 

Quando estou contigo o mundo perde o valor

Não vejo o tempo chegar com sua força cruel

O infinito é uma ilusão que está tão perto

O agora é para sempre um pedacinho do céu

 

Vem flor da emoção, clarear os meus sentidos

Ofuscar a minha solidão com seu perfume 

Levar para o infinito o meu perene sofrer

O momento sem você, em tristeza resume

 

Agora e para sempre um clamor brota em mim

Quero você em minha vida sem qualquer medo

No caminho sem rumo ao teu eterno prazer

Que me leva a você; descobrir o teu segredo.

 

Doce é sentir você aproximando-se do meu ser

Em um momento de loucura sentirmos juntos: o prazer

Mas descubro que são somente os meus sonhos

Querendo amenizar minha dor, da vontade de te ver. 

 

 

 

 

 

 

 

NÃO VÁ EMBORA AMOR

 

 

Meu coração sempre correu para o nada, mas fique aqui

Nossas vidas desencontraram em muitos caminhos tortuosos 

Mas não vá embora, não se vire para um outro olhar

Porque eu digo que ainda há uma chance para nossos sonhos

 

Um quarto vazio e frio onde dias esta a minha solidão

É o lugar onde não devo passar o resto de meus dias

Veja o brilho da manhã despontando para nossa paixão

Não vá embora amor, nunca diga para mim adeus

 

No momento estamos confusos, mas ouça o que vou dizer

O que nós precisamos é de um milagre em nossas vidas

Para podermos continuar a caminhar mesmo através da noite

Não vá embora quando entardecer, não deixe acabar assim

 

Como será possível continuar olhando para o infinito

Depois de perder o meu norte que é você, bússola minha

Não vá embora amor, nunca vá embora da minha vida

Pois tudo o que tem a fazer é ficar em nosso ninho de amor

 

Não vá embora amor, não vá embora de novo de mim

O tempo trará a felicidade, e tudo voltará a ser como antes

A sensação de nossos primeiros beijos ainda está no ar

E toda a minha vida é pouca para descobrir os seus encantos

 

Não vá embora amor, não vá embora assim

Não vá embora amor, nunca diga adeus

Não vá embora amor, não deixe acabar

Não vá embora amor, ainda há uma chance

 

Não vá embora amor, não vire o seu olhar

Não vá embora amor, bastas ficar e continuar

Não vá embora amor, veja o brilho da manhã

Não vá embora amor, ainda é possível sonhar.

 

UMA PADARIA, UM LUGAREJO E O VIAJANTE
 

Em um desses dias, em que você é obrigado a viajar mais cedo, por que só há poucos horários de ônibus para uma pequena cidade; cheguei na cidade, com duas horas de antecedência para um certo compromisso. Verifiquei o lugar onde seria o tal compromisso e comecei a caminhar pelas ruas empoeiradas do lugarejo. Andei uns quinhentos metros e encontrei uma padaria. Dei uma olhada para seu interior sem muita atenção e passei direto. Como a cidade não oferecia nenhum outro estabelecimento comercial mais atrativo e com as portas abertas naquele momento, voltei para a padaria.

            A padaria era muito espaçosa e completamente vazia de pessoas para comprar. Os móveis era poucos: alguns balcões desgastados pelo tempo e quatro jogos de cadeiras com mesas de plástico. O que mais me chamou a atenção, foi a pequena quantidade de pães que havia na padaria.

            Aproximei do balcão, esperei alguns minutos; aliás, longos minutos e apareceu um senhor já de idade com um sorriso de boas vindas no rosto. Ele disse:

            ___ Bom dia!

            ___ Bom dia! Respondi também com certa simpatia ___ O senhor tem água mineral? Perguntei, mas torcendo para não ter, pois a água mineral era apenas um despistes para entrar e ocupar uma das mesas do lugar.

            ___ Não! Respondeu o comerciante ___ Infelizmente acabou ontem. No meu pensamento ficou uma interrogação: teria realmente acabado a água mineral ou aquele estabelecimento nunca vendera água mineral e o senhor deu uma resposta básica para uma situação como aquela?

            Com um gesto de cabeça agradeci o comerciante e caminhei até a frente do local, sentando em uma das cadeiras encardidas pelo tempo – mais tarde, ao levantar do lugar, descobri que minha roupa ficara muito suja da poeira da cadeira. O senhor voltou a fazer o seu serviço de antes e da minha parte fui revisar alguns papéis para a reunião. Depois de alguns minutos, o comerciante pega uma sacola de feira e sai do estabelecimento dizendo para eu ficar a vontade, ele sobe em uma motocicleta que mais parece apenas uma bicicleta motorizada e desaparece no final da rua.

            Eu ainda não sabia, mas aquele lugar reservava-me uma bela surpresa. Uma moça, também muito simpática e bonita, vinda dos fundos da padaria, olha para mim e diz:

            ___  Bom dia!

            ___ Bom dia! Foi minha resposta, sem continuar a conversa, pois eu estava extremamente nervoso com a presença inesperada daquela moça, que mexeu profundamente com todos os meus sentidos masculinos.

            A moça, aparentando vinte e cinco anos e com uma aliança de noivado no dedo. Ela pega um pano de saco e começa a limpar as mesas em volta do local onde eu estou sentado. Olhando  de soslaio, também começo a observar melhor a moça: cabelos castanhos, pele morena, olhos que mudavam de tonalidades do preto conforme o seu jeito de olhar, um corpo muito bem defino que quando movimentava, mexia também com o meu coração. Ela continuava sua limpeza sem muita pressa e eficácia, mas com uma certa dedicação.

            Neste momento, entra na padaria uma senhora idosa carregando cinco vidros plásticos de refrigerante de dois litros, caminha até o balcão e deposita ali os vidros de forma aleatória. A moça pergunta:

            ___ Dona Maria, a senhora vai quer leite hoje?

            A senhora pára, pensa por alguns segundos; parecia que a resposta que daria logo a seguir era a coisa mais importante do mundo. Ela responde:                 

            ___ Acho que vou querer somente um litro. O leite já chegou?

            A moça responde que não, mas que vai reservar o leite. Depois pergunta:

            ___ Dona Maria, a senhora ainda trabalha em casas de família como empregada doméstica?

            A senhora pensa por alguns segundo antes de responder e colocando um tom grave em sua voz diz:

            ___ Graças ao Bom Deus, não! Eu já estou aposentada. E completou, com tristeza na voz ___ Hoje em dia, é muito difícil trabalhar em casas de família, além do ordenado ser bem menor; os patrões perderam o respeito por nossa profissão, em outras épocas, a doméstica era considerada como alguém da família.

            ___ Ah! Foi reação da moça, que não sabia o que dizer.

A senhora sai da padaria, sem ao menos notar a minha presença no local.

            A moça continua a sua limpeza, parando de vez em quando para olhar em minha direção. Em uma destas paradas, olha para fora da padaria e diz:

            ___ Senhor Nenê! Vamos entrar.

            Depois de um instante de silêncio, vejo entrar um homem baixinho com um latão nas costas. Era o tão esperado leiteiro chegando. Ele caminha até os fundos da padaria e volta logo após com outro latão vazio. O leiteiro pára em frente ao balcão e assim começa uma conversa trivial entre a moça e ele.

            ___ O senhor levanta muito cedo Seu Nenê?

            ___ É que tenho que ir para o roçado depois de tira o leite das vacas, minha filha.

            ___ Ah! E tem dado muito leite?

            ___ Nada menina. Só uns trinta litros mesmo, é a conta de trazer para cá e ficar um pouquinho lá em casa também. Minha mulher toma uns remédios muito fortes e precisa tomar leite todos os dias.

            ___ E não tem nenhuma vaca para criar (prenha) agora?

            ___ Não! Infelizmente, só daqui a alguns meses.

            ___ Que pena, nós estamos precisando de mais leite para vender aqui. E também estamos querendo fazer um novo tipo de pão que necessita de muito leite na massa.

            Os dois trocaram mais algumas palavras e depois, o leiteiro sai da padaria ajeitando o chapéu e dizendo:

            ___ Agora vou para o roçado.

            A padaria volta ao silêncio. A moça retorna ao balcão fingindo grande importância no ato de lavar alguns copos de vidro. Quando acaba de lavar os copos, vai até a garrafa, enchendo um copo pela metade. Bebe um gole generoso do café negro como seus olhos, levanta o copo em minha direção e pergunta:

            ___ Quer um pouquinho de café? E acrescentou ____ Foi eu mesma que fiz.

            Quando ela disse que tinha feito o tal café, senti um grande impulso para aceitar o convite para sorver o líquido negro e fumegante, mas ai veio da tal da timidez que me fez recuar da intenção de aceitar; com um gesto de cabeça digo não e volto a ler os relatórios.

            O som de vários gritos de crianças quebra o silêncio. Olho em direção à porta e vejo três crianças, de pé no chão, entrarem na padaria. Ainda correndo e gritando, vão até o balcão e pedem quatro pães e três pirulitos. Da mão da criança menor surge uma porção de moedas que servem para pagar a compra e ainda sobra alguns centavos equivalentes a uma bala de morango. A moça da padaria pergunta com ares zombeteiros, pois a resposta era evidente:

            ___ Querem o dinheiro ou uma bala de morango?

            Claro que a resposta foi a bala.

Da mesma forma que entraram, as crianças saíram quase atropelando um homem de capacete na cabeça que entrava na estreita porta da padaria. O homem chegou até o balcão e perguntou se havia leite. A moça respondeu que sim e foi até os fundo da padaria buscar os dois litros de leite, que o homem havia sinalizado com os dedos ao ar. Sem mais conversa e sem tirar o capacete da cabeça o homem pegou os litros de leite e foi embora.

A moça pega uma vassoura e começa a varrer alguns papéis de balas do chão, que estavam bem próximos de mim. Entre uma varrida e outra ela pergunta:

___ Você não é daqui?

___ Não. Estou só de passagem.

___ Eu não gosto daqui não. Confessa a moça ___ Quando vim da capital para cá foi uma grande decepção mesmo. Já faz três anos que estou aqui e ainda não acostumei.

___ É, cidade pequena é assim mesmo.

___ É mesmo, é um marasmo só. Completa a moça.

Com um novo gesto de cabeça, concordo com ela.

Um som, vindo de fora da padaria, chama nossa atenção. Era um bêbado que passava pela rua cantando cantigas antigas. Próximo da porta da entrada da padaria, ele para e diz:

___ Bom dia cachorrinho! E faz um gesto de reverência para um cachorro que por ali também passava.

Vendo aquela cena inusitada, a moça zombeteia:

___ Já ouvi dizer que “quem conversa demais, dá bom dia a cavalo”, mas dar bom dia a um cachorro é a primeira vez. E acrescenta ___ Bêbado é igual a passarinho na gaiola; não canta, pede socorro aos gritos.

O bêbado vai embora cambaleando e encostando de vez em quando nas paredes das casas para não cair.

A moça volta a varrer o chão, depois vai para os fundos da padaria, sumindo por detrás de uma cortina; assim do meu campo de visão e da pulsação inconstante do meu pensamento. Eu aproveito a oportunidade, saio da padaria e vou embora para meu compromisso. No meu coração ficou um gosto de paixão repentina e frustrada ao mesmo tempo. Um sorriso de aceitação momentânea surgiu na minha face ao lembrar da frase: “A pessoa certa, no momento errado; amor frustrado”.

 

 

 

 

O PÁSSARO QUE QUERIA VIRAR UM SAPO

 

 

          Em um lugar distante, em um tempo também distante, vivia um pássaro. Não era um pássaro famoso, daqueles que se coloca um nome, mas um pássaro qualquer, daqueles que ninguém dá valor ou quer ver por perto.

          O pássaro vivia sozinho, pulando de galho em galho, de uma árvore para a outra sem muita direção. Ele gostava de beliscar as frutas antes de madurarem e de quando em quando voava no céu azul, céu azul sim; pois naquela época, ainda não fora poluído pelas fumaças das chaminés das fábricas, pelos escapamentos dos carros...

          Um dia, voando próximo de um castelo, o pássaro ouviu o som de muita música, risadas e até gritos de felicidade. Só podia ser uma festa, foi o que ele pensou. Realmente, era uma festa muito bonita e animada. O pássaro parou em uma das janelas e passou a compartilhar daquele momento de felicidade para tantas pessoas.

          Do coração do pássaro, começou a surgir um sentimento de profunda tristeza, bem em contraste com a alegria que vinha do salão, bem na sua frente. Do meio das muitas pessoas que estavam dançando, o pássaro viu surgir uma linda garota. Cabelos negros como a noite, olhos espertos como de uma fera durante a caça, rosto meigo, um sorriso mais lindo que o luar, pele morena do sol tropical e corpo estilo violão. O pequenino coração do pássaro praticamente parou de bater naquele momento, foi uma paixão instantânea e arrebatadora.

          Sonhando acordado, o pássaro pensou estar dançando bem agarradinho com aquela linda garota. Os dois, no centro do salão de festas, bailavam ao som de belas canções de amor, enquanto as outras pessoas da festa batiam palmas para a maestria que havia na dança do casal. Um casal que vivia um momento e um romance impossível, pois ele era um pássaro; ela uma garota.

          Vindo, não se sabe de onde, uma pedra minúscula acertou a cabeça do pássaro, lhe tirando dos seus sonhos de paixão. Com a mesma velocidade da pedra, a realidade acertou o pobre pássaro. Pobre de amor, pobre por viver um amor impossível; pobre por conhecer o amor. Amor que é tão comum nos seres humanos, mas que não deveria passar de um instinto de acasalamento nos pássaros. Ele bateu as asas rapidamente, deixando para trás a festa, a imagem da garota e os seus melhores sonhos.

          Muitos dias, muitos meses, anos passaram-se, e a cada dia, o pássaro ficava mais tristonho. Há muito tempo mesmo, não mais pulava de galho em galho, nem beliscava as frutas antes de madurarem. O medo de voltar ao castelo, ser novamente atacado por alguma pedra e a saudade da garota tirava a felicidade do pássaro. Em um certo momento, ele já estava tão fraco e triste que caiu do galho da árvore onde passara os últimos meses de sofrimento.

          No chão, quase sem vida, o pássaro visualizou mais uma vez a imagem da garota dançando ao seu lado; sentiu saudade dos seus cabelos negros como a noite sambando ao som de uma linda música. Neste momento, ele pensou: talvez seja melhor ser um sapo.

          Com todas as forças que lhe restavam de seu corpo inerte, o pássaro implorou à Fada da Floresta:

          ___ Fada da Floresta! Fada da Floresta! Venha socorrer-me! Quero ser um sapo daqui para frente.

          A Fada da Floresta é um ser dotado com poderes especiais; que quando um animal, ave ou vegetal encontra-se em grande perigo, ela surge para atender o último pedido do moribundo.

          O vento parou de soprar, as folhas das árvores silenciaram o seu murmúrio e o próprio tempo cessou seu movimento continuo, para poderem reverenciar a Fada da Floresta. A Fada da Floresta havia ouvido as súplicas do pássaro. Ela perguntou:

          ___ Pássaro, pássaro querido, por que você quer ser um sapo. Os sapos que são tão maltratados pelos seres humanos. Que são apedrejados e até mortos por possuírem uma pele com aspecto viscoso. Você não sabe que as pessoas adoram jogar sal no sapo só para ver a morte lenta do pobre bicho.

          O pássaro respondeu, com convicção:

          ___ Os sapos não podem voar, não podem pular de galho em galho e até são mortos realmente pelo preconceito das pessoas, mas quando são beijados por uma linda princesa tornam-se majestosos príncipes. E o melhor, sempre, o príncipe acaba casando-se com a princesa no final da história.

          Aquela resposta, direta e ao mesmo tempo sincera do pássaro, mexeu com os sentimentos da Fada da Floresta, que perguntou novamente, mesmo já conhecendo o desejo no coração da ave:

          ___ Então, qual é seu maior desejo?

          ___ Fada da Floresta, eu quero que me transforme em um sapo, para um dia poder reencontrar a minha linda garota, minha querida princesinha!

          Ela caminhou em direção ao pássaro, encostou sua varinha encantada na cabeça dele e transformou-o em um grande sapo: um sapo-boi. O pássaro, que agora era um sapo, olhou para a Fada da Floresta com muito carinho e saiu pulando para a lagoa mais próxima; todo feliz.

          Os dias passam, as semanas passam, os meses passam, os anos chegam e nada do pássaro-sapo encontrar novamente a sua linda garota. Ele, agora, percebia que não havia feito uma boa escolha ao pedir para ser um sapo, pois sem voar era quase impossível chegar até as janelas do castelo e rever sua princesinha. O máximo que conseguia era sair alguns metros longe da lagoa e logo tinha de voltar para lubrificar sua pele que ficava ressecada.

          Vários anos depois, a garota, a princesinha do sapo, transformou-se em uma linda mulher; uma linda princesa cobiçada por todos os príncipes dos reinos vizinhos. Ela era conhecida como a Princesa Formosa.

          Um certo dia, a Princesa Formosa saiu para passear e fazer um piquenique em um bosque distante do castelo, onde havia uma lagoa muito bonita. Mesmo estando sozinha, a princesa correu na relva, brincou com as borboletas, molhou os pés na lagoa e depois, deitou-se sobre um tronco velho de árvore para descansar e dormiu profundamente. Sem que ela percebesse a noite chegou. E com a noite, os bichos horripilantes da floresta começaram a rodear a princesa. A Princesa Formosa acordou assustada com a noite escura e com o som aterrorizante que era produzido pelos bichos. A cada segundo, ela ficava mais apavorada e sem saber que rumo tomar naquela escuridão toda.

          Os sons, produzidos pelos bichos, foram ficando cada vez mais fortes; na verdade, insuportáveis para uma pessoa sensível como a Princesa Formosa. O tilintar de folhas e galhos quebrando com o caminhar dos bichos, já eram ouvidos bem próximo. De repente, bem pertinho da princesa, ouvi-se o uivar de um lobo:

          ___ Aaauuuuuuuuuuuu! Aaauuuuuuuuuuuu! Aaauuuuuuuuuuuu!   

          A princesa estava realmente apavorada e preste a perder a consciência de tanto medo. Mas eis que rapidamente, como em um passe de mágica, outro som começa a abafar os anteriores. Era o som realizado por um sapo-boi, que coaxava sem parar. O som produzido pelo sapo-boi conseguiu afugentar os outros bichos, que foram para o outro lado do bosque. Um silêncio profundo envolveu novamente o ambiente. Ainda em estado de choque, a Princesa Formosa caiu no chão, já desmaiada.

          No outro dia, os primeiros raios do sol fazem com que a princesa acorde de vez de seu pesadelo da noite anterior. Do seu lado estava um enorme sapo-boi, como que mantendo a guarda dela. A princesa olha para o sapo-boi e sente enorme ternura por ele, pois sabia que fora aquele sapo o responsável por afugentar os bichos que a apavoraram durante a noite. A Princesa Formosa diz, com carinho:

          ___ Meu sapo-herói! Meu herói-sapo!!!

          A Princesa Formosa segura o sapo entre as mãos, olha bem para os seus olhos lacrimejados e lhe dá um beijo de agradecimento e ao mesmo tempo apaixonado. Um feixe de luz invade o lugar e o sapo, o ex-pássaro, transforma-se em um homem; um charmoso príncipe. Um misto de espanto e felicidade invade os dois. Após alguns segundos de expectativa, o Príncipe Charmoso e a Princesa Formosa abraçam-se longamente, era um abraço apaixonado e agradecido.

          O príncipe e a princesa voltam para o castelo, contam o acontecido para todos e daí a poucos dias eles casam-se e vivem felizes para sempre. Aliás, até hoje, quem passa por perto não pode deixar de notar algo escrito na fachada do castelo: “Ao amor de um príncipe e uma princesa; de um pássaro que virou sapo e de uma donzela que perdeu o medo de beijar o sapo.”

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFRIGERANTES E HISTÓRIAS DE VIDA

 

 

          Noite quente na capital do estado. A cidade ferve pelo número de pessoas nas ruas e principalmente pela badalação dos jovens no sábado. Três amigos e eu, um grupo formado por dois  homens e duas mulheres, finalmente, havíamos encontrado um local para estacionar o veículo que nos conduzia para mais uma curtição da noite. Entramos na primeira casa noturna que encontramos. O garçom logo veio nos atender muito cortês, como é costume nos garçons por causa das famosas gorjetas. O pedido foi unânime:

         ___ Queremos refrigerantes! Um a garrafa para cada um.

         O outro homem do grupo quis um copo para tomar aquele líquido tão esperado; as mulheres preferiram usar a tecnologia de um canudinho na própria garrafa; da minha parte fui mais radical, preferi tomar direto no gargalo da garrafa. Assim que o garçom voltou com os pedidos, peguei a minha garrafa da bandeja com pressa, girei imediatamente a tampa e sem muita cerimônia coloquei na boca aquele líquido saboroso. De repente e sem explicação lógica, um sentimento nostálgico, virtual e real ao mesmo tempo, invadiu totalmente o meu ser. Tentei em vão voltar à realidade, mas os pensamentos do passado eram tão fortes que perdi a consciência do tempo presente. Então voltei ao meu tempo de infância. Meu pensamento transformou-se em poesia e passei a ser escritor da minha história. Que pode ser assim contada.

        

*  *  *

         A minha infância e adolescência foram vividas na zona rural do interior mineiro, em uma fazenda que ficava muito distante da cidade mais próxima. A fazenda era conhecida como Rancho Vargem Grande, devido ser quase toda ela uma planície rodeada por morros bem suaves ao longe. Os meus pais trabalhavam com muita dificuldade para sustentar os sete filhos, quatro homens e três mulheres, dos quais eu era o filho do meio, com oito anos. Ser o filho do meio era algo muito complicado, ou seja, um pouco desfavorável, pois não tinha nem idade para realizar as aventuras dos irmãos mais velhos e nem era suficientemente criança para exigir condições de atenção especial como faziam os caçulas, mas este fato em momento algum me atrapalhava, pois eu fui um garoto muito arteiro e inventivo. A casa em que morávamos tinha apenas três cômodos de chão batido, isto se for contar uma varandinha feita de bambus e coberta com folhas de coco; não havia banheiro e energia elétrica não sabíamos o que era. O fogão era de lenha e as panelas estavam gastas pelo tempo. Aliás, tudo ali merecia uma reforma urgente, mas que era impossível de acontecer. Apesar de todas as adversidades, éramos uma família unida e muito feliz.

         O momento mais esperado por toda a família era o final do mês, em que o meu pai recebia seu pequeno ordenado de vaqueiro e minha mão partia em uma longa viagem, a pé, até a cidade mais próxima para realizar as compras mensais. Na verdade, o que mais nos deixava ansiosos não era a sua viagem e muito menos o seu retorno em si, mas um precioso produto que acompanhava as compras; um objeto do nosso desejo de criança, que aos poucos ia tornando-se sagrado em nossas vidas e em nossas fantasias: uma garrafa pequeníssima de refrigerante.

         Sempre no último dia do mês minha mãe levantava-se com a madrugada, dava um beijo carinhoso em cada um de nós e saía  sorrateiramente sem dizer uma palavra, mesmo sabendo que estávamos fingindo dormir. Quando ela batia a porta para sair, pulávamos da cama imediatamente. Enquanto ela caminhava na estrada empoeirada em direção a cidade, ficávamos olhando da varanda o seu corpo, maltratado pelo tempo e pela labuta diária, sumir no horizonte, antes dos primeiros raios do Sol. Em algumas vezes, corríamos atrás dela e quanto abria a porteira da fazenda, gritávamos:

         ___ Não vá esquecer o nosso refrigerante!.

         Com um sorriso de cumplicidade, ela virava o rosto lentamente para o nosso lado e fazia um gesto de “vou pensar”.

         Durante aquele dia todo, ficávamos brincando próximo da Casa Grande, morada dos patrões e de seus filhos esnobes. O que ocorria na verdade, era que servíamos aos caprichos dos filhos dos patrões em suas brincadeiras: se eles fossem os policiais, nos éramos os bandidos que apanhavam e eram presos; e se eles fossem os médicos, nós éramos os pacientes, que tomavam as injeções e bebiam os remédios de mentira. Próximo do entardecer, nós retornávamos à varanda para ver ao longe o corpo de nossa mãe tomando forma por detrás da colina. Quando notávamos que realmente era ela, saíamos correndo em sua direção.

         Ao chegarmos perto de nossa mãe, um de nós era escolhido para puxar o assunto:

         ___ O dinheiro foi suficiente para realizar a compra toda?

         Nossa mãe desconversava e perguntava se nosso pai já havia chegado do trabalho. Respondíamos que sim ou não, com um gesto da cabeça e tornávamos a insistir:

         ___ Mamãe deu para comprar tudo o que queríamos este mês?

         A insistência na pergunta, escondia em suas entranhas a ansiedade de todos nós em saber se o objeto do nosso desejo fora comprado. A nossa mãe, transfigurada pelo cansaço da longa viagem, não expressava qualquer reação frente à pergunta, o que aumentava ainda mais a nossa expectativa. Nós sabíamos que, a cada novo mês, o dinheiro que nossa mãe levava para cidade, dava para comprar menos alimentos. Naquele tempo, a compra toda se resumia em uma “sacola  de mão” pela metade.

         O caminho até nossa humilde casa era tomado pelos causos que nossa mãe contava de como estava a cidade e das pessoas da zona urbana que eram insensíveis à realidade de quem vivia no campo. Chegando em casa, a sacola de compra era colocada em cima de uma pequena mesa no centro da cozinha. Em sua volta, ficavam os nossos olhos insistentes e curiosos a tentar descobrir o esconderijo da garrafinha de refrigerante. Nossa mãe ia retirando muito vagarosamente as compras da sacola, às vezes fazia um gesto de que não havia mais nada para ser tirado. Em um momento mágico para nossos olhos petrificados pela expectativa, víamos surgir a tão esperada garrafa de refrigerante. Em reverência, encostávamos somente a ponta do dedo indicador naquela minúscula garrafa de líquido precioso. A garrafa já estava com a temperatura ambiente, mas as gotículas de água em sua volta sinalizavam que havia saído bastante gelada de uma geladeira ou congelador de um bar importante; pois somente os melhores bares das cidades possuíam naquela época garrafas de refrigerante.

         Geralmente neste momento, o nosso pai já havia chegado em casa e passava a ser cúmplice daquele ritual familiar. A nossa mãe tomava ares de juíza e passava ao rito de repartir entre nós aquela bebida dos deuses. Nós sabíamos o quanto era sacrificado para os nossos pais comprar aquela garrafa de refrigerante e principalmente por deixarem de tomar o refrigerante para que os sete filhos pudessem viver um momento especial. Nossos únicos seis copos eram colocados sobre a mesa; assim, um de nós era escolhido para tomar o refrigerante diretamente na garrafa, o que tornava o momento mais emocionante. Minha mãe dizia:

         ___ Quem quer tomar o refrigerante “na boca da garrafa”, levante a mão.

         Todos levantavam as mãos e assim permanecíamos enquanto ela repartia o refrigerante entre os copos corroídos pelo uso. Em cada um dos copos era colocado pouco mais que a medida de dois dedos na horizontal, mas representava um incalculável tesouro para nós crianças sem qualquer perspectiva de riqueza no momento. Uma grande expectativa, muito próxima do êxtase, tomava conta do ambiente. Para que nada do líquido caísse na mesa ou no chão da cozinha feito de terra, era colocada uma bacia sobre a velha mesa, os pingos que ali caiam eram imediatamente reaproveitados. Os nossos corações  batiam a toda velocidade, em controvérsia com o nosso corpo totalmente retraído acompanhando os gestos suaves de nossa mãe. No decorrer deste processo sagrado para nós, as nossas mãos que estavam estendidas na vertical, começavam a ser vencidas pelo cansaço até ficar somente o vencedor de mãos para cima: o grande vencedor, aquele que teria o grande prazer de tomar o refrigerante diretamente na garrafa. Nossa mãe era uma mulher de poucas palavras, ela olhava para nós com carinho e com um gesto das mãos indicava que estava na hora de bebermos a nossa fração do refrigerante.  

         Mãos trêmulas aproximavam-se dos copos e da garrafa. Naquele dia, era eu o felizardo que tomaria o refrigerante na “boca da garrafa”. Confesso que não lembro de nenhum outro fato da minha infância que fosse mais emocionante que este momento em especial. Em um gesto sincronizado levávamos o líquido à boca sempre no mesmo instante. Naquele momento deixávamos de ser apenas crianças pobres e sem expectativa de vida digna, tornávamos reis e rainhas, nos assemelhávamos às crianças filhas do dono da fazenda e às crianças que moravam em belas casas na cidade. Tomar refrigerante, para nós, era recuperar a nossa dignidade, sentir que éramos iguais aos poderosos de todo o mundo. Quando a minha boca encontrou a “boca da garrafa” de refrigerante, naquele dia da minha infância, senti que estava suspenso no ar, que uma força maravilhosa invadiu todo o meu ser. O refrigerante era tomado devagar como que para eternizar o momento, com aquela sensação gostosa de felicidade frente ao nosso objeto de desejo. No rosto de nosso pai e de nossa mãe, um sorriso maroto sinalizava a sensação do dever realizado mais uma vez, mesmos não sabendo por mais quanto tempo ainda seria possível realizar aquela extravagância da nossa ilusão de crianças utópicas.

         Assim foi passando os nossos dias, e com eles a nossa infância. A minha infância pobre, mas feliz...

 

*  *  *

          Um som estridente, de uma garrafa caindo das mãos do garçom no chão da casa noturna e quebrando-se em cacos, tirou-me do estado de nostalgia, de lembranças tão profundas e consistentes. As pessoas ao meu redor pareciam tão distantes e impessoais; quis voltar aos meus pensamentos de infância, mas eles fugiram para o infinito do meu inconsciente.

            Agarrei a garrafa de refrigerante, que estava sobre a mesa, com mais intensidade, na verdade como um guerreiro que segura sua caça mais preciosa; como um jogador que acabou de ganhar a sua taça e não quer separar-se dela. Olhei para aquela garrafa e procurei visualizar o passado. Agora, de forma bem diferente de minutos atrás, quando o garçom entregou o refrigerante e a tomei com violência; levei a garrafa até a minha boca devagar e comecei a beber aquele líquido em pequenas porções. Bebia sentindo não só o seu sabor, mas também o seu significado para toda a minha construção de vida; como escritor que lê e escreve a própria vida além das aparências. Descobri que, hoje, temos dinheiro para comprar infinitas garrafas de refrigerantes, mas esquecemos o valor das coisas simples. Uma sensação inigualável traspassava o meu peito, sensação esta que procuro levar para o infinito da imaginação e para a veracidade do concreto, em todo os momentos da minha existência.  

 

 

 

 

 

 

 

 

RECORTES DAS AVENTURAS DE UMA GAROTA SUPER SAPECA

 

          Amelinha nasceu ao meio-dia, de um dia muito ensolarado. Cresceu como a brisa do vento que se torna um furacão. Crescimento rápido, na mesma proporção de sua beleza, inteligência e alegria.

 

* * *

          Por ser muito elétrica, Amelinha sempre custava a dormir, ficava no seu quarto com as luzes acesas, pois tinha medo do escuro e temor de ser assustada pelas travessuras que ela própria aprontava durante o dia. Todos os dias, quando a garota ia dormir, sua mãe sentava do seu lado na cama e conta muitas histórias legais como “O Chapeuzinho Vermelho” “Os Três Porquinhos”, “O Pássaro que queria virar um Sapo”, “Branca de Neve e os Sete Anões”, além de várias outras histórias que a mãe criava a partir das aventuras de Amelinha naquele dia.

 

* * *

          Amelinha gostava muito de brincar com os amigos da sua rua, mas em algumas ocasiões o clima esquentava entre eles. Um dia, ela estava brincando de futebol com seus coleguinhas, a bola que impulsionava a brincadeira também era de Amelinha. Depois de já terem brincado bastante, resolveram formar novos times. Um sorteio democrático e legítimo foi realizado, mas Amelinha ficou de fora dos dois times. Ao certificar-se que não jogaria naquele momento, Amelinha correu até onde estava a bola, colocou-a debaixo do braço, saiu correndo e dizendo:

          ___ Se eu não vou jogar, ninguém mais brinca, pois a bola é minha.   

          E realmente, a brincadeira acabou naquele dia.

 

* * *

          Um certo dia, Amelinha perguntou para sua mãe:

          ___ A senhora sabe qual é a coisa mais horrível do mundo? 

          A mãe olhou a expressão de tristeza que a filha trazia no seu rosto de criança e perguntou com carinho, antes de tentar uma resposta à pergunta da garota:

          ___ Não! Qual é na sua opinião?

          ___ As pessoas e as coisas que a gente gosta morrerem de uma hora para outra sem explicação.

          A resposta rápida e sincera da garota pegou a mãe de surpresa. A mãe de Amelinha ficou em silêncio por alguns segundos, com a cabeça girando ao encontro de palavras para aquele momento; como não encontrou nada de importante para amenizar a direção que tomava a conversa, perguntou novamente:

          ___ Minha filha, por que você está e falando isso?

          ___ Mamãe, é por que, hoje, deu uma vontade enorme de chorar pela morte do “Frufru”.

          A mãe logo lembrou. “Frufru” era o nome de um gato peludo que vivia na casa da avó de Amelinha há muitos anos e que morrerá atropelado por um caminhão havia alguns meses. Na época da morte do gato, Amelinha não esboçou nenhuma reação, mas somente agora ela chorava a perda do animal companheiro de muitas aventuras.

 

* * *

          Um dia, a avó de Amelinha estava fritando muitos salgados e por isso colocou uma roupa velha, um lenço na cabeça e um avental surrado, o que a deixou com um aspecto de velha bruxa malvada.

          Amelinha chegou, olhou lentamente o aspecto da avó em volta do fogão, aproximou-se, lhe deu um forte abraço. A avó, surpreendida com o gesto da garota, disse:

          ___ Querida! Com está roupa estou muito feia, não é mesmo.

          Amelinha pensou um pouco e respondeu:

          ___ Não vovó, você está simplesmente linda. Muito bonita mesmo.

          Com um sorriso, a avó dá um beijo na neta e continuo sua atividade.

          Em outro dia, também na casa da avó, Amelinha e as primas dela estavam brincando de boneca debaixo de uma árvore no quintal. De repente e sem motivo aparente, Amelinha e uma das primas começaram a brigar, chegando a trocarem uns bons murros uma na outra. Para separar as duas e acabar com a briga, a avó deu um pequeno tapa no traseiro da Amelinha; que chorou um pouco, enxugou as lágrimas, olhou firmemente para a avó e disse:

          ___ Lembra daquele dia em que a senhora estava com aquela roupa estranha e eu disse que estava muito bonita.

          ___ Claro que eu lembro minha neta.

          ___ Pois é, eu menti, a senhora estava horrível, uma bruxa.

 

* * *

          Na escola, Amelinha sempre era a primeira a chegar e a última a sair. Primeira, pois sempre gostava de sentar em sua carteira preferida, bem ao lado da carteira da professora; última, pois brincava tanto nas aulas que não acabava suas atividades no tempo certo.

 

* * *

          Com o tempo inflexível, Amelinha cresceu, tornou-se uma linda mulher e depois uma mulher sábia, mas nunca deixou de ser um raio de alegria no meio de uma tarde escura de tempestade. 

 

 

 

 

 

 

 

 

EDUCAÇÃO E AS ROSQUINHAS

 

          A realidade educacional do Brasil passa por um dos momentos de maior crise. Todos os testes, pesquisas e documentários demonstram que a grande maioria dos brasileiros tem dificuldades na hora de escrever e ler um texto simples. A situação torna-se pior ainda quando se fala na compreensão e utilização do ler e escrever como ferramentas críticas. São dados realmente desanimadores, que nos levam a um questionamento: será que há uma solução eficaz para que a população brasileira conquiste este direito básico que é a educação de qualidade?

            Muitas teorias e métodos são idealizados todos os dias. Muitas destas teorias estão descontextualizadas da realidade do povo, pois, principalmente, surgem dos escritórios e laboratórios e não do “chão da escola”, da cultura do povo. Isto tem causado um distanciamento cada vez maior das necessidades da população e o que é oferecido nas escolas. O certo é que alguma coisa precisa ser realizada e com urgência.

            Duas correntes teóricas antagônicas dominam os acontecimentos no dia-a-dia da sala de aula. Correntes com ideários de certa forma opostos, por isso alvo de críticas constantes, uma pela outra.

            A primeira corrente é a dos que defendem uma educação voltada para o professor; possui uma profunda resistência diante da idéia que o aluno pode aprender por si mesmo e seu dia-a-dia é cheio de cobranças. Criticam qualquer renovação profunda na educação e apóiam-se na tese de que a educação de antigamente era muito melhor, dizem: “Naquela época as crianças aprendiam muito mais só com a quarta série do que hoje depois que já fizeram a faculdade”.

            Do outro lado, temos a segunda corrente, em que seus seguidores defendem uma educação totalmente voltada para o aluno; para o saber que ele traz de casa, ou é capaz de descobrir a partir de uma situação a ele exposta. Criticam com veemência qualquer interferência maior do professor no processo de ensino-aprendizagem. Apóia-se em uma visão equivocada das teorias do construtivismo, transformando-o em método de ensino.

            Diante disso tudo, eu tenho uma concepção de educação que busca juntar o que tem de bom nas duas correntes: da segunda, o aluno como ser capaz de produzir conhecimentos com autonomia e criatividade; da primeira, a importância do professor como transmissor de conhecimentos sistematizados. Uma teoria completando a outra, pois o que o aluno descobre por si mesmo, precisa passar pelo crivo das ciências para ganhar fundamentação, ser sistematizado, e deixar de ser apenas senso comum. Educador e educandos são duas peças fundamentais e complementares no processo da aprendizagem.

Para mim, educação é igual a rosquinhas: as “rosquinhas de nata” de  minha mãe. Ficaram curiosos? Isto mesmo educação igual a rosquinhas. Tudo bem! Vou explicar melhor.

            Durante a minha infância e adolescência, fui uma pessoa muito gorda, obeso mesmo. Chegando a pesar 120 kg aos 18 anos. Depois de muita resistência e principalmente por complicações de saúde, resolvi fazer um regime rigoroso e depois reeducação alimentar.

            Um grande problema foi o “café da manhã”, pois o meu corpo não se adaptou com a maioria dos alimentos recomendados. Até que um dia comi algumas “rosquinhas de nata” e para minha surpresa houve uma adaptação instantânea ao regime e a meu organismo. O regime e a reeducação alimentar deram muito certo e chequei a perder 46 kg.

            Já faz mais de dez anos que comecei o processo de regime e de reeducação alimentar e, até hoje, ainda como no “café da manhã” três “rosquinhas de nata” (feitas com muito carinho por minha mãe) e um copo de leite. O mais interessante é que continuo gostando das “rosquinhas de nata” da mesma forma.

            O segredo do sucesso das rosquinhas é muito simples e ao mesmo tempo criativo. Os ingredientes para produzir as rosquinhas são os de sempre e até o gosto/sabor é o mesmo de 10 anos atrás. Mas a inovação são as formas dadas as rosquinhas por minha mãe. São rosquinhas redondas, trançadas, grandes, pequenas, achatadas, quadradas, compridas, curtas, em forma de animais e objetos. Aquelas formas variadas e criativas, cativavam-me, e ainda cativam. Como uma criança frente a um brinquedo novo, divertia-me com as minhas três rosquinhas de cada dia. Havia sempre a expectativa de saber como seriam as formas daquele dia.

            O alimento não mudava, o sabor era o mesmo, mas a diferença era a forma de apresentação. Assim também deve ser a educação. Mesmo dentro da rotina da sala de aula, todos os dias devem ter uma roupagem nova, uma apresentação cativante. O processo de aprendizagem como algo espetacular; não fantasioso, mas surpreendente.  

            O mais importante na educação é o ler, o escrever, o entender o que foi lido e escrito e trabalhar bem com os números. Está é a missão primeira da educação escolar; que necessita de um trabalho conjunto dos professores, dos alunos e da família. Ler, escrever, entender e trabalhar com os números, são as “rosquinhas de nata” da educação, principalmente da Educação Básica.

            Minha mãe, mulher de poucas palavras e letras, dá com sabedoria um grande exemplo para todos os indivíduos envolvidos com a educação sistematizada: mesmo sendo todos os dias, na escola, uma repetição constante de atividades e procedimentos; que sejam realizados de formas diferentes e criativas, que conquistem através da novidade, da surpresa.

            Um sistema educacional, uma escola que valorize a criatividade dos alunos, que tenha educadores comprometidos com a Língua e as Ciências, com espírito de renovação, onde cada novo dia também é uma nova oportunidade para a descoberta e a felicidade, é o que toda a sociedade deve buscar. Certamente, em uma ambiente deste, tanto educador como educandos terão condições de demonstrar o melhor de si e crescerem juntos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A ESPERANÇA DE UM OPRIMIDO

 

Menino por que choras?

O que foi que aconteceu?

Você está tão tristonho.

Foi alguém que te bateu?

 

Não seu moço, foi isto não.

É que estou muito cansado.

Os meus braços estão doendo.

Este trabalho é muito pesado.

 

Mas você é muito novo.

Você tem que ir estudar!

Aprender a ler e escrever.

E mais tarde se formar.

 

Não tem como meu senhor.

Essa dor ‘por fora’ logo some.

E se eu parar de trabalhar,

minha família passa fome.

 

Eu entendo seu problema.

Isso comigo aconteceu.

Mas quando você crescer,

poderá ser doutor feito eu.

 

É o que eu espero senhor,

ter uma casa sem pranto.

E que amanhã, eu possa colher

as sementes que hoje planto.

 

 

 

 

 

 

O PÔR-DO-SOL E AS FASES DA VIDA

 

            A melhor definição para as fases da vida, em um contexto poético e reflexivo, é o Pôr-do-Sol em um desfiladeiro perto do mar.

            O céu azul e ensolarado, com o passar do tempo irredutível e constante, vai tornando-se verde, amarelo, abóbora, vermelho, roxo e depois mergulha na completa escuridão. Tons de cores que, na medida que vão aumentando sua intensidade, demonstram a finitude de um ciclo infinito: do pôr-do-sol, da própria vida.

            O Azul é um bebê cheio de vida e ansioso pelo desabrochar dos   outros tons de cores.

            O Verde é uma criança que dá seus primeiros passos, ainda incertos.

            O Amarelo é um adolescente com toda a sua vivacidade e rebeldia frente a tudo e a todos.

            O Abóbora é um jovem que crítica os valores da sociedade, mas também lutas pelas soluções dos problemas.

            O Vermelho é o adulto que passa pelos maiores problemas, mas também pela fase da vida mais frutuosa.

            O Roxo é um velho pronto para fechar um ciclo e começar outro com o que acumulou de sabedoria em sua vida.

            E a Escuridão é o fim do ciclo diário do Sol, que voltará no outro dia mesmo que entre as nuvens. A Escuridão é a morte, mas é na morte que voltamos nossa vida totalmente para a luz do amanhecer do Criador, para a infinitude.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O AUTOR

 

 

José Maria Cardoso, nasceu no dia 31 de janeiro de 1978, em uma cidade do interior de Minas Gerais, chamada Ipanema. Formado no Curso Normal de Magistério na EE Coronel Calhau em 1995, não mais parou de trabalhar na arte de ensinar. Formado no Curso Normal Superior em 2005, Campus de Ipanema do Centro Universitário de Caratinga - MG e Pós-graduado em Docência do Ensino Superior em 2007, pela Universidade Candido Mendes - RJ. Atualmente é Analista Educacional, da Equipe Pedagógica, da Superintendência Regional de Ensino de Caratinga - MG, Palestrante e Contador de Histórias Infantis.

 

Site : www.escritorjmcardoso.xpg.com.br

Blog : escritorjmcardoso.zip.net

E-mail : escritorjmcardoso@bol.com.br

              josemariaed@bol.com.br

 

             

 

Obras Editadas:

·        Totalidade Humana “Em Busca da Vida”, Editora Caratinga, 2004.

·        Totalidade Humana II “Vidas Especiais”, Editora Caratinga, 2005.